*Fernanda Letícia de Souza
Os mais de quatro mil atletas que já defenderam o Brasil em Olimpíadas estão espalhados por toda a imensa extensão territorial do país. É o que diz uma pesquisa realizada recentemente pela Universidade de São Paulo, que se propôs a traçar um mapa dos locais de origem destes heróis nacionais.
Segundo a pesquisa, com exceção do Tocantins, todos os demais 25 estados e o Distrito Federal já “fabricaram” algum competidor que representou o país nos jogos. Ao longo desses 100 anos de Olimpíadas, cerca de 440 cidades brasileiras formaram atletas olímpicos. O tipo de atleta que vem de cada estado parece ter relação com características geográficas, naturais e sociais de cada região.
Santa Catarina se destaca como celeiro de atletas de handebol, pois o esporte é muito praticado nas escolas públicas e privadas da maioria dos municípios catarinenses. A Bahia é referência quando o assunto são os boxeadores. Com nomes expressivos no boxe nacional e internacional, o estado baiano tem mais de mil academias de iniciação ao esporte que se apresenta como ferramenta de transformação social da realidade de milhares de crianças e adolescentes. No Paraná, o destaque é a ginástica rítmica, praticada em larga escala nas escolas, que faz o estado brilhar em Olimpíadas. As águas do Rio de Janeiro são especiais para a prática da vela e muitos talentos olímpicos deste esporte se formam neste cenário exuberante.
No entanto, é preciso tomar certo cuidado com os números da pesquisa, que podem dar a falsa sensação de que o país possui incentivos e igualdade de condições para a prática de esportes em todas as suas regiões e estados. Considerando os números dos últimos Jogos Olímpicos, fica claro que esta igualdade ainda está longe de ser alcançada: 74,3% do total de atletas era do Sul e do Sudeste, estados que têm, juntos, somente 56% da população brasileira, segundo dados do IBGE. O Nordeste, que sozinho corresponde a 28% da população do país, foi representado por 12,16% dos atletas, enquanto o Norte, que tem 8% da população do país, teve apenas cerca de 2% dos atletas. Surpreendentemente a região Centro-oeste, a de menor densidade demográfica com 7%, teve uma representatividade de 8% de atletas classificados.
Os estados do Norte e do Nordeste do país são os que apresentam as situações mais críticas, quando o assunto é incentivo ao esporte, o que acaba fazendo com que muitos talentos promissores se percam pelo caminho e abandonem a carreira de atleta. Com problemas sérios de acesso a condições básicas de vida como moradia e alimentação, os poucos recursos disponíveis nem chegam às políticas de incentivo ao esporte. “Primeiro, sou muito feliz de representar a Região Norte, meu estado do Pará, mas ao mesmo tempo muito triste. São apenas três atletas da região. Acredito que seja por falta de incentivo e estrutura. Muitos atletas desistem e não chegam ao profissional. Poderia mudar a vida de outras tantas pessoas. O atleta profissional tem que sair de lá muito cedo, e muitas dessas famílias não têm condições para manter esse sonho”, declarou Rogério Moraes, um dos destaques da seleção brasileira de handebol masculino em Tóquio 2020/2021.
As Olimpíadas de Paris 2024 iniciam em breve e a esperança é sempre por uma melhora do desempenho brasileiro, com a conquista de um número expressivo de medalhas, sejam elas de ouro, de prata ou de bronze. Mas é preciso ter consciência de que todo atleta brasileiro que consegue a classificação para uma olimpíada já carrega no peito uma medalha, pois a vaga é fruto de trabalho árduo e muita luta. Se esse atleta for do Nordeste ou do Norte, esta medalha tem um brilho ainda maior, considerando as adversidades pelas quais passa para seguir na carreira de atleta.
A nós cabe torcer muito e vibrar por cada atleta que carrega consigo a representatividade da imensa diversidade social, econômica e cultural que se espalha de norte a sul e de leste a oeste do Brasil. No pódio do povo brasileiro, já são todos medalhistas de ouro.
*Fernanda Letícia de Souza é Especialista em Fisiologia do Exercício e Prescrição do Exercício Físico e professora da Área de Linguagens Cultural e Corporal do Centro Universitário Internacional UNINTER
Por: Valquiria Marchiori